PEC da Segurança será votada na CCJ com alto risco de rejeição

PEC da Segurança será votada na CCJ com alto risco de rejeição


A proposta do governo Lula para reestruturar o sistema de segurança pública, por meio de uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC), enfrenta resistência crescente no Congresso. Com votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados prevista para quarta-feira (9), o texto é criticado por centralizar decisões sobre políticas de segurança nas mãos do governo federal em detrimento dos governadores, ignorar a realidade dos estados e ter sido elaborado sem diálogo com os profissionais da área.

O texto final da proposta ainda está sendo finalizado pelo deputado Mendonça Filho (União-PE), relator da PEC. Segundo a assessoria do parlamentar, ele pretende alinhar o texto, nesta terça (8), em uma reunião com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) e os líderes partidários.

Na quarta-feira, os membros da CCJ votarão a constitucionalidade do texto. Se for aprovado, ele segue para análise em uma comissão especial, onde sofrerá alterações, até a conclusão de um texto final para votação no plenário da Câmara.

A PEC, entregue ao Congresso em 23 de abril de 2025, teria o objetivo de padronizar e modernizar a atuação dos órgãos de segurança pública em todo o país. Mas é vista por críticos do governo como uma forma de Lula tentar influir na questão da segurança pública para explorar o tema na próxima campanha presidencial.

Uma pesquisa de opinião pública realizada no início de junho mostra que a violência é a principal preocupação dos brasileiros. Atualmente, a gestão do tema cabe principalmente aos governos estaduais, que têm o controle sobre as polícias e as políticas de segurança locais. Mesmo que o governo Lula não aprove a PEC, poderá argumentar na próxima campanha eleitoral que tentou mudar o cenário.

Entre os principais pontos do texto estão:

  • Inclusão das guardas municipais no rol dos órgãos de segurança pública, com poder de policiamento ostensivo e comunitário, sob controle do Ministério Público
  • Aumento das atribuições da Polícia Federal no combate ao crime organizado
  • Criação da Polícia Viária Federal (PVF), que substituiria a PRF e atuaria também em ferrovias e hidrovias federais
  • Constitucionalização dos fundos de segurança pública, para garantir que os recursos não sejam contingenciados
  • Coordenação nacional pela União, centralizando diretrizes e integração das forças estaduais e municipais

Na avaliação do líder da oposição, Zucco (PL-RS), o texto do governo é “muito ruim e não combate diretamente a criminalidade”. “Conversei com muitas pessoas, inclusive do centrão, e há um consenso de que, para ser aprovada, a PEC terá de passar por muitas melhorias”, disse à Gazeta do Povo.

“Seria necessário atacar os problemas processuais da nossa Justiça que beneficiam bandidos, aumentar penas, dar mais garantias e condições de trabalho aos policiais e reconhecer as guardas municipais como polícias. Nada disso foi feito, apenas demonstrando o descaso do governo Lula com o avanço dos índices de violência e do crime organizado”, complementou Zucco.

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PEC expõe risco de aprofundar mais instabilidade institucional

Em meio ao agravamento da crise da segurança pública no país, a PEC apresentada pelo governo federal para reestruturar o setor é alvo de críticas. Para o analista político Alexandre Bandeira, o texto da PEC revela falta de diálogo, pouca efetividade e riscos de aprofundar ainda mais a instabilidade institucional em Brasília.

Segundo Bandeira, o maior erro da proposta está no modo como foi construída: “montada entre quatro paredes”, sem ouvir as categorias que lidam diretamente com a realidade das ruas. “Há uma ressonância clara de associações de delegados, de policiais, se manifestando contra. Faltou diálogo”, afirma.

Ele classifica o texto como “higiênico”, sem contato com a realidade crua enfrentada diariamente pelos agentes de segurança. “O problema da segurança é para ontem, não para daqui a seis meses”, dispara.

Na avaliação do analista, a proposta traz “muito esforço para pouco resultado”. As duas principais iniciativas da PEC — constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública e o fundo de financiamento — já estão reguladas em legislações infraconstitucionais. “Na prática, já existem”, aponta.

Segundo Bandeira, outro ponto sensível é o fortalecimento das guardas municipais com poderes típicos de polícia. “Já existe um abismo entre o trabalho das polícias civil e militar. Dar esse poder aos prefeitos [que controlam as guardas municipais] é mexer na burocracia do sistema sem resolver o problema real”, argumenta. Para ele, a PEC não garante mais investigação, nem mais prisões, tampouco mais segurança para a população.

Resistência da bancada da segurança à PEC

Parlamentares da oposição avaliam que o projeto enfrentará resistência para ser aprovado. A bancada da segurança pública avalia que a PEC da Segurança, em sua forma atual, é inviável e prejudicial à autonomia dos estados e à eficiência das forças de segurança. A expectativa é de um embate significativo na CCJ da Câmara, com a oposição buscando a rejeição ou a reescrita total do texto do governo.

Para o deputado Alberto Fraga (PL-DF), a PEC, se aprovada, será “evidentemente com muitas mudanças”. Ele ressalta que a CCJ se manifestará sobre a constitucionalidade do texto e aponta a “intervenção” – a interferência nos estados – como o principal problema. “Elaborar o Plano Nacional [de Segurança Pública] é o mesmo que dizer: o governo federal vai dizer o que é que as polícias estaduais têm que fazer e que os governadores têm que acatar. No meu entendimento, isso fere o princípio do pacto federativo”, afirmou.

Fraga acredita que as maiores alterações ocorrerão na comissão especial, mas reitera que o texto enviado pelo governo “não traz nenhum avanço no combate à criminalidade, especialmente combater o crime organizado no país”.

Para o deputado Coronel Tadeu (PL-SP), a proposta é a “PEC do Caos”. Ele critica a centralização das decisões e afirma que o texto “não produz absolutamente nenhum efeito prático” na segurança pública. O parlamentar concorda que a PEC “precisa ser reescrita na sua totalidade”.

O Capitão Alberto Neto (PL-AM) foi na mesma linha e afirmou que “a PEC da forma como está não tem condições de prosperar”. Ele classificou a proposta como “desastrosa, que afronta diretamente o pacto federativo e pretende centralizar na União o comando da segurança pública nos estados”.

Em sua visão, o governo federal já demonstrou incapacidade na área de segurança pública e, portanto, não deveria “querer comandar as polícias estaduais, sem conhecer a realidade local de cada estado”. 

Com críticas de especialistas e parlamentares, além de um cenário político conturbado, a proposta do governo corre o risco de ser barrada ainda na CCJ da Câmara. Se seguir adiante, enfrentará um Congresso dividido e um calendário apertado.

Trâmite longo, ano curto

Como toda Proposta de Emenda à Constituição, a da Segurança enfrentará um caminho legislativo complexo. Ela precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça, por uma comissão especial e ser votada duas vezes no plenário de cada Casa Legislativa, com quórum qualificado. “Esse processo pode levar meses ou anos”, explica. Com o calendário apertado de um ano pré-eleitoral, as chances de aprovação em 2025 são mínimas sem um grande acordo político. E qualquer tentativa de acelerar o processo, como pular etapas regimentais, pode ser contestada no STF. “Uma PEC precisa ser exaustivamente debatida”, reforça o analista.

Além do conteúdo da proposta, há um impasse político que pode travar sua tramitação. “A relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso hoje não existe”, afirma Bandeira. A recente crise provocada pela reoneração do IOF e a campanha “Inimigos do Povo” – em que o governo Lula se apresenta como “defensor” dos mais pobres e rotula o Congresso como legislador em favor do mais ricos – desgastaram ainda mais os laços entre Executivo e Legislativo. “Criou-se um ambiente muito complexo.”

A instalação da CPI do Crime Organizado, prevista para agosto, deve acirrar ainda mais o cenário. Para Bandeira, não se trata de coincidência: “É mais uma instância para criar um ponto de inflexão no rito desse projeto”. CPIs, lembra ele, são sempre desgastantes para o governo, tanto na imagem pública quanto no relacionamento político. “O governo tem muito mais problemas para resolver do que coisas boas para colher no Congresso.”



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