Lula isola o Brasil e popularidade cai

Uma das mais tradicionais publicações mundiais, a The Economist, revela uma fase desafiadora para o Brasil e seu presidente, Luiz Inácio Lula da Silva. A reportagem, intitulada “Sonhos Desbotados”, mostra a perda de influência do país no cenário internacional e a crescente impopularidade de Lula internamente. A análise sugere que o presidente, embora tenha anteriormente projetado o Brasil no mapa global, não conseguiu se adaptar a um mundo em constante transformação.
“Sonhos desbotados”: o diagnóstico da The Economist sobre o Brasil
Segundo a The Economist, a política externa brasileira, sob a atual gestão, tem sido caracterizada por uma incoerência crescente. O Brasil tem se alinhado de forma notável com países como China e Irã, ao mesmo tempo em que se distancia do Ocidente e dos Estados Unidos.
Um exemplo claro, segundo ela, disso foi a reação do Ministério das Relações Exteriores brasileiro aos ataques dos EUA a sítios nucleares iranianos, no dia 22. A nota do Brasil “condenou veementemente” a ação, descrevendo-a como uma “violação da soberania do Irã e do direito internacional”. A postura colocou o Brasil em rota de colisão com as democracias ocidentais, que apoiaram os ataques ou apenas manifestaram preocupação.
Brics: de plataforma de influência a instrumento anti-Ocidente
A aproximação com o Irã deve continuar na cúpula do Brics, que acontece em julho, no Rio de Janeiro, com a esperada presença de uma delegação iraniana. O país se tornou membro do bloco em 2024. Atualmente presidido por Lula, o Brics, que já foi uma plataforma para a influência global do Brasil, agora o faz parecer “cada vez mais hostil ao Ocidente”.
Especialistas apontam que, à medida que a China e a Rússia utilizam o Brics para legitimar suas políticas externas e a guerra na Ucrânia, respectivamente, fica mais difícil para o Brasil manter uma postura de não-alinhamento. Sete dos 11 países que o integram são ditaduras.
A falta de esforço de Lula para forjar laços com os Estados Unidos é evidente, aponta a The Economist. Até agora não houve nenhum encontro entre Lula e o presidente americano, Donald Trump, desde que este último assumiu o cargo em janeiro. O Brasil a maior economia cujo líder não se reuniu com o presidente dos EUA. Em contraste, Lula tem se aproximado da China, encontrando-se com o presidente chinês, Xi Jinping, duas vezes no último ano.
Diante desse cenário complexo, diplomatas brasileiros têm concentrado esforços em temas menos controversos para as cúpulas internacionais. No Brics, a pauta focou em cooperação em vacinas e saúde, transição para energia verde e manutenção do status de nação mais favorecida no comércio internacional. O objetivo é evitar discussões sobre a substituição do dólar em transações comerciais, um tema sensível para o presidente americano, e manter o Irã em uma posição discreta. Segundo um diplomata sênior brasileiro, o momento atual é de “contenção de danos, mais do que de criação de novos instrumentos”.
Apesar dos desafios, Lula tem buscado expandir os laços comerciais com outras regiões, aproveitando a perda de confiança global nos EUA como parceiro comercial. O presidente tem se aproximado da Europa e fortalecido as relações comerciais. Em março, visitou o Japão para promover a carne brasileira como alternativa à carne americana, que o país asiático importa em grande parte dos EUA.
Além disso, ministros brasileiros se reuniram com burocratas chineses para aumentar as importações agrícolas do Brasil, provavelmente em detrimento das americanas. Contudo, essas iniciativas comerciais são acompanhadas de “esforços grandiosos” que, por vezes, superam a real projeção do Brasil no palco mundial, como a presença de Lula nas comemorações do fim da Segunda Guerra Mundial em Moscou, onde tentou mediar o conflito na Ucrânia, sendo o único líder de uma grande democracia a comparecer.
Queda livre na popularidade: o reflexo interno da crise
A fragilidade na cena internacional é agravada pela queda de popularidade de Lula no Brasil. Durante seus dois primeiros mandatos (2003-2010), o Brasil colheu os frutos de um boom de commodities, e Lula era um dos líderes mais populares do mundo, com sua força doméstica emprestando credibilidade no exterior.
Atualmente, a situação é bem diferente. A popularidade de Lula está em declínio, com aprovação pessoal em torno de 40%, o nível mais baixo de seus três mandatos, e apenas 28% dos brasileiros aprovam seu governo.
A queda pode ser atribuída a diversos fatores, incluindo a mudança do cenário político brasileiro para a direita. Muitos brasileiros associam o PT a escândalos de corrupção, um legado que levou Lula à prisão por mais de um ano, embora sua condenação tenha sido posteriormente anulada.
A base de apoio tradicional do partido – sindicatos, católicos engajados socialmente e beneficiários de programas sociais – tem se alterado em um Brasil onde o cristianismo evangélico cresce exponencialmente, o emprego na agricultura e na economia gig (por demanda) se expande rapidamente, e a própria direita oferece programas de assistência.
Incapacidade de liderança regional agrava isolamento
Além disso, a incapacidade de Lula de unificar a América Latina tem sido notável. Ele não se comunica com seu homólogo argentino, Javier Milei, devido a diferenças ideológicas. Apesar de ter inicialmente acolhido Nicolás Maduro, da Venezuela, quando assumiu o cargo em 2023, a relação azedou apenas após Maduro “roubar abertamente” outra eleição no ano passado.
O Brasil, que liderou a missão da ONU para estabilizar o Haiti após o terremoto de 2010, agora se mantém em silêncio enquanto o país mergulha no caos. Lula parece “incapaz ou não disposto a reunir as nações latino-americanas” para formar uma frente unida contra as deportações de migrantes e a guerra tarifária do governo Trump.
A aparente indiferença do presidente Trump em relação a Lula, mesmo criticando outros líderes mais próximos a ele, pode ter duas razões, conforme a análise: o déficit comercial do Brasil com os EUA, que beneficia o país norte-americano, e a percepção de que o Brasil, por ser relativamente distante e geopoliticamente inerte, não tem grande relevância em questões como as guerras na Ucrânia ou no Oriente Médio.